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Esse é um livro bem difícil de avaliar. Principalmente por conta de ser minha primeira leitura em formato de peça, e por conta de seu tamanho não impedir de ser bem decepcionante (se é que é possível envolver decepção em algo que você não sabe muito bem o que esperar).

‘O Beijo no Asfalto’ tenta ser muitas coisas — misterioso comovente e até mesmo carioca, sendo que o Rio de Janeiro em si é um pano de fundo bem deixado de lado —, porém não passa de homofóbico. Na intenção de criar uma aura misteriosa em volta do acidente com o homem desconhecido e o beijo que ocorre em seguida muitos personagens interagem entre si a fim de entender o que realmente aconteceu, levando a uma série de suposições desnecessárias enredadas por comentários machistas e homofóbicos que só servem para fazer o leitor odiar certos personagens que já não eram de muita serventia.
O ponto central, e que interliga os demais, de eu não ter gostado dessa leitura é seu formato de peça, dividido em atos. Por ser um estilo completamente fora da minha zona de conforto até cheguei a dar uma pesquisada para não ficar completamente perdido, mas não acabou adiantando muita coisa: os diálogos são confusos, difíceis de entender e terminam de forma abrupta, tornando-o uma experiência complicada em formato de texto.
Logo no fim do livro vem um texto de apoio escrito por Flávio Aguiar, professor da USP e autor de ‘Anita’, analisando o texto de Nelson, esmiuçando que as interrupções entre os diálogos são sua maneira de demonstrar a incerteza dos personagens — o que até concordo, se estivesse assistindo a peça e não lendo o roteiro. Sem contar que tenta justificar os comentários ofensivos dos personagens como uma forma que eles acharam de lidar com conflitos “mais complexos”. Se isso não é um absurdo, eu não sei o que é.
Sendo assim, ‘O Beijo no Asfalto’ é, a grosso modo, um montante de coisas erradas. Uma ultima surpresa amarga é que essa foi uma história escrita especificamente para Fernanda Montenegro que, para quem não sabe, há pouco tempo atuou em uma novela em que sua personagem era uma senhora lésbica orgulhosa de sua sexualidade e que viveu toda uma vida ao lado de sua parceira; logo, saber que ela encenou na primeira montagem dessa peça é bem decepcionante. Sim, são tempos completamente diferentes em questão, mas esse não deveria ser o ponto. O ponto é: chega de representatividade negativa. Uma história só veio para disseminar negatividade sem tentar chegar a um ponto benéfico não merece espaço na estante alheia.

Mione Le Fay é carioca, formada em Jornalismo. Escritora, professora de informática, apresentadora e produtora de eventos. Apaixonada por livros e fotografias, encontra nesses nessas duas artes uma forma de mostrar tudo o que existe em seu mundo.

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