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Durante o Salão Carioca do Livro autora negra e mineira confirmou o interesse em ingressar na Academia Brasileira de Letras, sendo ovacionada pelo público ao manifestar seu interesse. Houve inclusive algumas controvérsias com a opinião equivocada de outra autora que havia estado no evento um dia antes e dito que “Conceição não queria ir para ABL”… Colocação a qual a própria futura imortal respondeu com um simples e eloquente: “…Eu quero!É um direito nosso, vou me inscrever na segunda-feira”

Desde o dia 21 de abril a cadeira de número 7 da Academia Brasileira de Letras (ABL) está vaga, por conta da morte do cineasta Nelson Pereira dos Santos. No dia 26 de abril, a ABL realizou uma sessão solene para anunciar a abertura da vaga. A notícia movimentou coletivos negros e de mulheres em uma campanha para indicar quem poderia ser o próximo ou a próxima “imortal”. E com a possível consagração de Conceição.

A autora com uma das carreiras mais célebres da literatura contemporânea brasileira, vencedora do Jabuti e com reconhecimento internacional; ainda falou com bastante sabedoria sobre o modo como a mulher negra costuma ser retratada pelos autores ao longo da história da literatura. Destacou como o corpo feminino negro tende a ser posto sempre à mercê dos desejos e fantasias de quem o escreve nas histórias e que a sexualidade neste caso coloca tais personagens sempre no papel de sedutoras à serviço de seus senhores. Falou ainda que as mulheres em geral tendem a ser retratadas dentro de uma perspectiva unicamente cristã, onde o corpo feminino somente alcançaria “redenção” através da maternidade, e assim o corpo da mulher negra fica excluído até mesmo desta “dita salvação”, uma vez que ela sempre aparece como a “tentação”, a “ama de leite” ou “mãe preta” – ou seja, a mãe das crianças alheias e quase sempre brancas.

Preocupada em ser vista como uma excepcionalidade na autoria negra, a autora contou que riu da ideia no começo. Mas, agora decidiu. E convidou o público a uma reflexão sobre o que é literatura universal? “Eu escrevo a partir da minha subjetividade de mulher negra e encontro identificação mesmo internacional. Então, quem definiu isso do que é Literatura Universal? Eu leio Jorge Amado, mas não sou nenhuma Gabriela” – disse.

Quanto à ABL, a jornalista Flávia Oliveira, mediadora da mesa, ressaltou de modo brilhante ser “uma instituição monótona, masculina e branca”. Pois de fato ainda apresenta quase nenhuma diversidade, onde se observa que poucas mulheres já ocuparam suas cadeiras e nenhuma delas negra.

Nascida em uma favela de Belo Horizonte, Conceição Evaristo trabalhou como empregada doméstica, até se mudar para o Rio de Janeiro, aos 25 anos, onde passou em um concurso para o magistério. Graduou-se em Letras, é mestra em Literatura Brasileira pela PUC-Rio e doutora em Literatura Comparada pela Universidade Federal Fluminense. Consagrou o conceito de Escrevivência, quando em 1995, enquanto a autora escrevia sua dissertação de mestrado, o jogo de letras, sentidos e ideias deu vida à junção dos verbos escrever, viver e se ver.

Este ano, a cotada escritora foi a homenageada oficial da FestiPoa Literária e passou três dias em Porto Alegre, lotando os auditórios André Ávila / Agencia RBS. Em 2015, Conceição Evaristo esteve em Paraty como convidada de uma programação paralela em uma edição do evento criticada por não ter convidado negro de peso. Em 2017, ela foi uma das primeiras confirmadas para a festa literária e sua mesa foi das mais concorridas.

Os dois momentos citados ilustram como a obra da autora, que escreve desde os anos 1980 e estreou na literatura em 1990, só na última década foi descoberta por um público mais amplo do que o Movimento Negro. Entre as obras de Conceição Evaristo estão: “Insubmissas Lágrimas de Mulheres”, “Ponti Vicêncio”, “Becos da Memória”, “Poemas da Recordação e Outros Movimentos”, “Histórias de Leves Enganos e Parecenças”.

Podemos certamente afirmar que aos 71 anos, e tendo tido seu merecido reconhecimento tardiamente, Conceição representa uma esperança para escritoras negras mais jovens – profissionais ou amadoras – de que seus trabalhos e amor pela literatura podem um dia dar frutos e funcionar à sua própria “Escrevivência”. E ficamos na expectativa que tal esperança seja consolidada com sua merecida cadeira entre na ABL, apesar de saber que para tantos e tantas ela JÁ É certamente uma IMORTAL.

Há duas petições online foi criadas para que fosse incluído o nome de Conceição Evaristo como nova ocupante da cadeira de número 7.Petição 1 e Petição 2

Reportagem construída com alguns dados das seguintes fontes:


Mione Le Fay é carioca, formada em Jornalismo. Escritora, professora de informática, apresentadora e produtora de eventos. Apaixonada por livros e fotografias, encontra nesses nessas duas artes uma forma de mostrar tudo o que existe em seu mundo.

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