A OESTE DE RAVKA, ONDE GRISHAS SÃO ESCRAVIZADOS E ENVOLVIDOS EM JOGOS DE CONTRABANDISTAS E MERCADORES…
…fica Ketterdam, capital de Kerch, um lugar agitado onde tudo pode ser conseguido pelo preço certo. Nas ruas e nos becos que fervilham de traições, mercadorias ilegais e assuntos escusos entre gangues, ninguém é melhor negociador que Kaz Brekker, a trapaça em pessoa e o dono do Clube do Corvo.
Por isso, Kaz é contratado para liderar um assalto improvável e evitar que uma terrível droga caia em mãos erradas, o que poderia instaurar um caos devastador. Apenas dois desfechos são possíveis para esse roubo: uma morte dolorosa ou uma fortuna muito maior que todos os seus sonhos de riqueza.
Apostando a própria vida, o dono do Clube do Corvo monta a sua equipe de elite para a missão: a espiã conhecida como Espectro; um fugitivo perito em explosivos e com um misterioso passado de privilégios; um atirador viciado em jogos de azar; uma grisha sangradora que está muito longe de casa; e um prisioneiro que quer se vingar do amor de sua vida.
O destino do mundo está nas mãos de seis foras da lei – isso se eles sobreviverem uns aos outros.
Lá vem o mundo dando voltinhas marotas. Não sou o maior fã da Trilogia Grisha. Em grande parte por sua protagonista com motivações vazias. Mas adoro o universo criado pela Leigh e, ao começar essa leitura, fui tomado por uma saudade desses elementos fantásticos e seu sistema de magia que não sabia que sentia. Foi gostoso voltar para o mundo Grisha, e mais ainda com uma trama mil vezes melhor que sua antecessora.
É evidente desde o início, mesmo nos primeiros capítulos, a evolução na escrita da Leigh. Onde na Trilogia Grisha, que a história decai a cada livro (muito hater mesmo ninguém me segura), em Six of Crows temos um ritmo mais engrandecedor. Inclusive em quesito narrativo. É um pouco difícil engrenar na leitura pelas primeiras 100 páginas, pois são mais lentas para estabelecer personagens e afins, mas adiante tudo estabelecido a leitura voa (apesar de que eu demorei para ler por motivos de tempo faltante, mas toda vez que pegava voava sim).
Narrado em vários pontos de vista, o livro se faz por seus personagens. Mostrando diferentes crenças, visões de mundo e até mesmo preconceitos, cada um dos seis protagonistas toma forma de maneira grandiosa. Todos preenchidos com múltiplas camadas e de personalidades muito distintas, empregando narrativas muito diferentes umas das outras. No fim das contas, eles não possuem convicções que todo mundo concordaria, mas é muito fácil entender, e até aceitá-las na medida dos acontecimentos e todos cativam individualmente.
Destacam-se Kaz, o líder do grupo (e completamente dono da porra toda) portador das mais profundas cicatrizes que um lugar como Ketterdam poderia causar, e Inej, uma ladra astuta conhecida como Espectro de tão silenciosa, por seus passados super deturbados — na verdade, todos são sofridos, mas eles em especial — e por serem simplesmente fodões. Mas principalmente, a dona do meu coração, Nina. Em um mundo em que, atualmente, os Grishas são caçados por estarem em minoria, ela, como Grisha Sangradora, tem completa noção do que é para o resto do mundo e não tem medo de lutar contra isso e por seus interesses acima de tudo.
O grupo é meio que separado em pares, com interações muito bem elaboradas e amarradinhas. Kaz e Inej se complementam de maneira sutil. Possuem um modo de cuidar um do outro muito subentendido, como uma regra implícita que esconde sentimentos que os dois negam às aparências. Jesper e Wylan seguem a vibe dos opostos se atraem. O atirador viciado em jogos de azar, e azarado que só ele, se aproxima do perito em explosivos que veio de berço de ouro num crescente tímido, porém constante, de sentimentos que ele reluta em transparecer que é muito gostoso de ler e uma representatividade que acrescenta muito para a história. Mas de todos, o par que mais me envolveu, e que mais causa atrito, foi Matthias e Nina (muito dona do universo mesmo). Quando o nascido de um povo que acredita que os Grishas são uma sub-raça e que os caça como bruxas, se apaixona justamente por uma Grisha que não tem medo de fazer o que for preciso por seus “iguais”, o resultado acaba sendo uma relação mista de desconfiança e uma tensão inebriante que os mantêm atraídos um pelo outro independente de quão sua rivalidade pré-estabelecida tente separá-los.
Complementando ainda mais o preenchimento desse universo tão vasto, é maravilhoso ver, apesar de originalmente terem sido escolhas meia boca e até meio chatas de ler, as consequências da Trilogia Grisha acontecerem aqui. Não tenho muita certeza do espaço de tempo entre uma história e outra, mas a Leigh mostra muito bem como o mundo inteiro, não só Ravka, sofreu com os acontecimentos de Ruína e Ascensão. Seja na imensa queda da cultura Grisha, ou na influência de personagens anteriores para os atuais, certos momentos servem como complementos para acontecimentos passados que são interessantes de saber que continuidade levaram.
Six of Crows é, em suma, uma grande mistura que da MUITO certo. Os questionamentos aqui impostos — religiosos, raciais, sociais; todos importantíssimos — os personagens incríveis, um mundo que ainda possui muita história para se contar, e uma história solidamente inebriante são até pouco para descrever essa jornada. Daqueles livros de acender a chama de admiração por uma autora que me causava incerteza por motivos que já gritaram bastante nesta resenha, mas que agora com certeza é alguém a se manter debaixo da asa.
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