O Livro dos Negros conta a história de Aminata Diallo, uma das personagens femininas mais fortes
e marcantes da ficção contemporânea. Aminata foi sequestrada, ainda criança, na África, e vendida
como escrava na Carolina do Sul.
Após a Revolução Americana, ela foge para o Canadá e escapa da vida de escrava para tentar
uma nova história em liberdade. O livro traz uma história que nenhum ouvinte e nenhum leitor
esquecerão.
O nome “O Livro dos Negros” se deu devido ao documento histórico, mantido por oficiais navais
britânicos, ao fim da Revolução Americana. O documento oficializou os negros que serviram ao rei
na Guerra e fugiram para Manhattan, no Canadá, em 1783. Apenas os negros que estivessem no
Livro dos Negros poderiam escapar e conseguir sua liberdade.
Aminata Diallo percorre toda uma longa trajetória com a finalidade de conseguir entrar no livro dos
negros e conquistar sua liberdade.
A obra, marcante e inesquecível, tornou-se uma miniserie de sucesso nos Estados Unidos. Dirigida
e escrita por Clemente Virgo (The Wire) e protagonizada pela atriz Aunjanne Ellis e Cuba Gooding
Jr., vencedor do Oscar em 1996.
Tenho que começar essa resenha confessando que foi muito difícil encontrar uma forma coesa para escrevê-la, porque O Livro dos Negros é aquele tipo de obra memorável que nos transporta através de sua estória e faz com que cada palavra ou reflexão de suas páginas atinja bem o centro de nosso coração. Para mim foi uma experiencia única, começando pela atitude de Lawrence Hill em abordar de forma tão honesta e profunda a escravidão africana nas Américas, apoiando-se em experiencias vividas por seus antepassados que viveu aquilo que foi certamente um dos períodos mais horrendo e vergonhoso da história da humanidade. O livro se passa no século XVII e nossa protagonista é a inteligente e curiosa Aminata Diallo, sequestrada na África ainda criança e vendida para as Américas como escrava.
O livro se divide em quatro partes e dentro de cada uma dessas partes temos fragmentos do presente e do passado, conforme a Aminata dos dois tempos distintos nos transporta para dentro dos caminhos que a fizeram escrava e sua vida nas Américas como tal.
Nos trechos que descrevem a aldeia onde Aminata nasceu, Bayo, o autor pontua bem toda a diversidade e grandeza do continente africano. Sua miríade de dialetos, credos, e formas de existência diversificada. Toda a sua dimensão geográfica desconhecida pelo homem branco, os toubabus e até mesmo por aqueles nascido no continente, além de todo o espanto e choque causa por culturas tão distintas. Naquele período nenhum africano se reconhecia como africano,não entendiam tal definição e ainda hoje vivem sob eco dela. Algo que parece querer apagar todo o mosaico de etnias que existem no continente. Se você nasceu no continente americano, mais especificamente na América no Sul – Brasil, ninguém te chamará primeiramente como sul-americano, mas sim como brasileiro. O mesmo deve ser aplicado a África. Quem nasce na África, pode ser antes de tudo cangolês, angolano, nigeriano etc. A questão pode se aprofundar ainda mais quando vista a partir da dinâmica de uma divisão menor, como uma aldeia. Aminata por exemplo, até o fim se reconhecia como alguém nascida e pertencente a aldeia de Bayo, onde até o dia seu sequestro, ela vivia uma vida feliz ao lado de seus pais e para onde sempre sonhou em retornar.
Tragicamente separada de seus pais, Hill não nos poupa de todo sofrimento e humilhação ao que nossa protagonista junto com outros cativos é submetida. Sendo o ponto alto desse momento, a travessia pelo o que Aminata e seus conterrâneos conheciam como o Grande Rio e os europeus como Oceano Atlântico. A travessia pelo mar dentro de um navio negreiro é uma das passagens mais tristes, realistas e desesperadora desse livro. Brilhantemente, Lawrence Hill não deixou de apontar a importância e participação dos africanos no tráfico de cativos para América e como estudante de História, durante os vários fatos históricos descritos nesta obra, eu sempre buscava por uma inconsistência histórica, mas Lawrence foi extremamente crível em tudo o que se propôs a fazer.
Vendida como escrava na Carolina do Sul, Aminata precisou lhe dar com estupro, a quase morte de seu nome e crença, um tratamento humilhante que ela custou para entender sua natureza dura e preconceituosa, mas também encontrou amigos entre os seus, amou, aprendeu a ler clandestinamente, manteve vivo os ensinamento de seus pais e precisou se destacar para sobreviver e lutar por sua liberdade. Tornou-se uma viajante e por fim uma grande djeli ( um sábio contador de histórias em certos locais da África) que ela sempre sonhou. Obviamente que nada disso, justifica as provações pelas quais ela precisou passar e a própria personagem reconhece esse fato. Através de Aminata e seu estranhamento com a forma de ser dos brancos, o autor nos proporciona uma série de questionamentos reflexivos do tipo: Por que eles não plantam sua própria comida como nós em Bayo?Por que esse trabalho todo de nos enfiar em navios fétidos e nos trazer pra cá?Por que nos tratam assim?
É um livro repleto de trechos emocionantes que por muitos momentos me fizeram chorar sobre as páginas. Em outros momentos eu precisei dar um tempo do livro para digerir tudo o que estava acontecendo. Embora seja baseado em documentos reais e traga até mesmos personagens que de fato existiram, em parte não é uma história real, mas poderia ser tamanho é o realismo que possui. Com certeza um livro incrível, marcante e que trás personagens maravilhosos e que se propõe com sucesso a tratar do ponto de vista daqueles que sempre estiverem as margens da História. Depois de ler a trajetória de Aminata, tudo o que eu torço é para que surja na literatura mais livros como esse. Parabéns a Primavera Editorial pelo belo trabalho que fez traduzindo esse livro para o português e pela belíssima capa que ele possui. Assistam ao booktrailer e até a próxima!
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