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Um mundo espetacular. Política, preconceito e revolução se misturam e vão fazer pensar.’ – Gillian Flynn, autor de Garota Exemplar – A partir de 1980, um por cento das crianças nascidas no mundo começou a apresentar sinais de inteligência avançada. Essa parcela da população, chamada de ‘brilhantes’, é vista com muita desconfiança pelo restante da humanidade, que teme a forma como esse dom pode ser usado. – Nick Cooper é um deles, um agente brilhante treinado para identificar e capturar terroristas superdotados. Seu último alvo está entre os mais perigosos que já enfrentou: o responsável pelo maior ataque terrorista dos últimos tempos, na bolsa de Nova York, que pretende começar uma guerra civil. Para capturá-lo, Cooper precisa se infiltrar em seu mundo e ir contra tudo em que acredita. – Brilhantes apresenta um universo ao mesmo tempo perturbador e incrivelmente semelhante ao nosso, onde um dom pode se tornar uma maldição

Não digo que gostar desse livro foi uma surpresa, pois pela sinopse eu já sabia que seria muito bom, mas digo que não esperava mergulhar tão profundamente nesse mundo tão intrínseco. Estive de olho nele desde que foi traduzido, mas acabei empurrando para frente até que dou de cara com o segundo livro já lançado e percebo que fiquei muito para trás, logo precisava deixar de ser trouxa e amém que eu fiz isso, pois é um livro sensacional.

Numa sociedade muito próxima da nossa, a partir dos anos 1980 uma parcela de 1% das crianças nascidas desenvolveram extrema inteligência, acarretando em habilidades cognitivas que os diferem consideravelmente das pessoas normais, tanto pelas coisas especiais que são capazes de fazer quanto pelo perigo que podem representar em grande escala. Eles são chamados de brilhantes. Um agente brilhante especializado em caçar e combater ameaças terroristas superdotadas, muitas vezes julgado por caçar a própria “raça”, Nick Cooper, se vê de frente de seu maior alvo: o responsável pela explosão da bolsa de valores Nova York e pela morte de milhares de pessoas: John Smith.

De mãos atadas diante de tamanho poder de destruição, Cooper percebe que o melhor jeito de derrubar as estruturas da casa do inimigo é por dentro. Assim ele se infiltra no submundo dos terroristas, voltando-se contra tudo pelo que acredita: seu trabalho, sua equipe, seu país; tudo isso em ordem de proteger seu maior bem, os filhos, e impedir que eles tenham um futuro onde uma nova guerra civil abale os pilares mundiais.

Com uma escrita incrível e uma narrativa frenética, recheada de diálogos maravilhosos — inteligentes e sarcásticos, ao mesmo tempo passando uma naturalidade extremamente sagaz e um uso muito bom das entrelinhas — e personagens carismáticos que mostram diversas facetas e compõem uma grande rede de conexões que funciona perfeitamente. Cooper mostra-se o protagonista perfeito por sua habilidade de reconhecer padrões. Ele vê movimentações minúsculas na fisionomia das pessoas e sabe prever seus movimentos, no caso de uma perseguição, ou dizer quando estão incomodadas ou mentindo, e coisas assim. Mas quem se sobressai mesmo é a Shannon. Cooper e Shannon se conhecem quando estão de lados opostos do grande jogo, e quando ele se infiltra no universo do crime seus caminhos se cruzam novamente e uma relação de impossibilidade irresistível se forma. Provavelmente meu apreço por ela se dê pelo fato de que ela se torna uma espécie de musa para o Cooper. O tempo todo ele meio que prestigia sua habilidade, colocando-a num pedestal que ele espera alcançar; como um constante “ai eu amo essa mulher!” Sem contar que da uma vontade de gritar com os flertes delícia infinitos entre os dois.

O cuidado e o apreço pelos detalhes é o que faz o mundo de Brilhantes ser tão vívido e tangível, quase factual. Entre alguns capítulos o autor insere pequenos artigos e comentários de celebridades fictícias sobre os superdotados, criando assim uma cultura própria — com seus escritores, jornalistas, comediantes, formadores de opinião em geral. Com uma imprensa massiva sobre os brilhantes, tanto positiva quando negativa, é claro que surgiria a famigerada opinião popular. Pois querendo ou não, o povo manda na tendência. E como não poderia deixar de existir, o preconceito que os considera uma raça à parte é tão opressivo quanto aos homossexuais, relação feita pelo próprio autor no livro, que se não fossem pelo surgimento dos superdotados, ou anormais, os gays é que seriam os atacados pelas massas ignorantes.

Como nem tudo são flores, não apenas o lado bom de ser um gênio perante os padrões é posto em evidência. Ao longo do livro temos vislumbres do que uma sociedade pode fazer com um brilhante, que eles não estão imunes às adversidades da vida. Com os poderes dos brilhantes sendo classificados em escalões, de um a quatro, quando as crianças chegam à idade de oito anos, eles são submetidos a um teste para descobrirem seu nível de habilidade. Caso uma criança seja considerada do primeiro escalão, ela é enviada para uma academia de superdotados, onde são tratados como menos que nada, ensinados a não confiar em ninguém que não seja a figura adulta previamente designada para cada um, geralmente uma pessoa normal, preparando-os como em um campo militar completamente dominativo. Destruindo suas mentes até que tornam-se pessoas alienadas e facilmente suscetíveis.

O dedo na ferida de Brilhantes é o quão o mundo apresentado no livro é semelhante ao nosso. Cheio de confrontos políticos, onde os grandes poderes tomam decisões apenas em prol da massa opressora, deixando de lado a porção, por enquanto mínima, que poderia contribuir tão mais quando já contribui. Onde a mídia controla o que a população pode ou não ter fácil acesso, pregando a censura de forma exorbitante e abusiva. Terrorismo e conspirações sendo abordados por diversas visões diferentes, mostrando não apensas um lado de uma história. Uma trama intrincada e tão alcançável que está a um surgimento dos brilhantes de distância de nós.

Por ter levado um bom tempinho lendo por motivos de estava lendo-o junto com Mentes sombrias, que me deixava meio sem vontade de ler, sinto que minha leitura pode ter sido um pouco prejudicada na hora de retomar a leitura. Sentia certa distância para com os personagens de imediato, tendo que retomar o ritmo, porém, depois de uma pensada, vejo que esse vai e volta no fim das contas não impediu o livro como um todo de ser simplesmente maravilhoso.

Mione Le Fay é carioca, formada em Jornalismo. Escritora, professora de informática, apresentadora e produtora de eventos. Apaixonada por livros e fotografias, encontra nesses nessas duas artes uma forma de mostrar tudo o que existe em seu mundo.

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