Gostaria de poder começar esta matéria falando sobre a expressividade de Xavier Dolan no cinema atual. Infelizmente, não posso fazê-lo, ao menos não de maneira profunda. Apesar de ter entrado em contato com o trabalho do cineasta já há alguns anos, a primeira vez que realmente vi um de seus filmes foi há algumas semanas, quando decidi assistir sua estreia na direção, “Eu Matei Minha Mãe”.
Agora, porém, depois de ver “Amores Imaginários”, posso garantir que irei dedicar um pouco mais da minha atenção a Dolan. Evoluindo drasticamente do amadorismo de seu primeiro filme, o diretor entrega uma belíssima e hipnotizante história sobre a idealização amorosa.
“Amores Imaginários” conta a história de Marie e Francis, dois amigos inseparáveis – isto até a chegada de Nicolas, um charmoso jovem do interior que chega a Montreal. Os três logo se tornam um grupo. Mas Francis e Marie, ambos apaixonados por Nicolas, acabam desenvolvendo fantasias obsessivas em torno do rapaz, embarcando numa verdadeira disputa pela atenção do mesmo e comprometendo sua antiga amizade.
Quando reduzido apenas a sua trama, é difícil identificar o impacto de “Amores Imaginários”. A premissa é extremamente ordinária, assim como o desenvolvimento pode às vezes se tornar previsível. A força de “Les Amours Imaginaires”, entretanto, está em sua impressionante sensibilidade e na técnica firme de Xavier Dolan, que divide seu tempo entre o roteiro, a direção e o papel principal. Dolan dirige com o desespero de um apaixonado, mostrando os pontos de vista tanto de Marie quanto de Francis. É possível sentir o nervosismo de seus personagens em cada quadro e em cada diálogo. Uma das maiores vitórias do estilo que o diretor adota neste longa é a maneira como a câmera foca extensamente nos cacoetes de uma pessoa sob pressão em vários planos-sequência: as mãos trêmulas, os olhos inquietos e até mordidinhas nos lábios. Similarmente, o roteiro desenrola-se de maneira extremamente poética, compensando a simplicidade de sua premissa.
“Amores Imaginários” marca uma evolução impressionante de Dolan em relação a sua estreia. Neste, estão presentes vários elementos comuns aos de “Eu Matei Minha Mãe”, com a diferença que “Les Amours” é muito mais maduro e focado. Se “J’ai Tué Ma Mere” encontrava dificuldades com sua direção extremamente amadora, sua fotografia mal trabalhada, seu roteiro repetitivo e seus personagens bipolares, “Les Amours Imaginaires” encontra sua força na confiança genuinamente profissional de Dolan, que parece ter encontrado seu tom. Até mesmo os depoimentos à parte de “Amores” são mais maduros, mais poéticos e mais pertinentes que os de “Eu Matei Minha Mãe”. Entretanto, há uma característica que não se altera entre os dois longas: a emoção sufocante e desesperadora que parece redimir mesmo as maiores falhas.
“Les Amours Imaginaires” pode muito facilmente se tornar um clássico. Com uma trilha sonora marcante, cenas icônicas e uma beleza poética que é especialmente surpreendente ao lembrarmos que o diretor/roteirista/ator a realizá-la tinha, na época, apenas 21 anos, “Amores Imaginários” não é um filme para aqueles que se irritam facilmente com histórias mais lentas, mas sua transcendência com certeza será intrigante o suficiente para propiciar pelo menos uma noite de reflexão.
Nota: 9/10
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