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Existe alguma coisa hipnótica nos filmes de Ingmar Bergman. Uma dos maiores mestres do cinema mundial, Bergman faz filmes sobre a angústia, sobre a dor, sobre coisas que gostaríamos que não existissem. E por isso suas obras nos assombram tanto. É preciso ter nervos de aço para sair intocado por qualquer um de seus filmes. Bergman, com suas dúvidas e questionamentos, sempre nos faz duvidar e questionar, e por isso sentimos com tanta facilidade a dor de seus filmes. Não é a toa que é um dos maiores diretores da história do cinema, e, em “O Sétimo Selo”, um de seus mais famosos e mais aclamados filmes, todos os traços de sua genialidade convergem num conto estarrecedor e assustador.

“O Sétimo Selo”, obra que consolidou sua carreira logo depois de seu filme “Sorrisos de Uma Noite de Amor” ter chamado atenção em Cannes, conta a história de Antonius Block, um cavaleiro que vive no século XIV. Antonius acabou de voltar das Cruzadas, apenas para encontrar sua terra natal devastada pela Peste Negra. No caminho, ele encontra a Morte em pessoa, que diz que é sua hora. Inconformado, Antonius desafia a Morte para uma partida de xadrez que decidirá o destino de sua vida.

“E quando o Cordeiro rompeu o sétimo selo, houve silêncio no céu por cerca de meia hora”. Assim como a passagem na Bíblia, o filme é uma alegoria ao silêncio de Deus, um dos temas mais recorrentes ao longo da trama. A ausência e a dúvida quanto à existência de Deus, mesclados com o medo da morte, resultam em atormentadas  reflexões por parte dos personagens, que nos atingem como socos no estômago e no coração.

A morte é uma figura constante no filme. Alguns a recebem de braços abertos, enquanto outros a temem. Antonius procura nela sentido, e, através dela, tenta descobrir por que Deus se esconde – e se realmente há algum Deus. Quem ou o quê é Deus, realmente? Uma das parábolas existenciais mais profundas de todos os tempos, “O Sétimo Selo” mostra, com seus vários personagens, como cada um encara Deus e a morte, e como cada um é deixado no escuro e na incerteza, sem saber o que o aguarda do outro lado. Não existem respostas. A dúvida nos torna infelizes – mas como não duvidar, quando não temos certeza de nada?

“O Sétimo Selo” demonstra todo o talento de Bergman, que continuaria a ser explorado e por fim chegaria ao ápice em seus futuros filmes “Persona” e “Gritos e Sussurros”. Bergman tinha um talento especial para assustar pobres mortais. Toda a técnica – roteiro, direção, iluminação, sonoplastia – convergem para o objetivo de nos fazer duvidar de nós mesmos, e, por fim, nos deixar sozinhos com nossas dúvidas. Cheio de diálogos impressionantes e cenas marcantes, como a icônica Dança da Morte, é impossível sair de “O Sétimo Selo” sem se sentir pelo menos um pouquinho transformado – e assustado. O medo é um sentimento que descreve muito bem qualquer filme de Bergman, e, aqui, predomina o medo da morte e do vazio, um medo presente na vida de cada um de nós. “O Sétimo Selo” não é apenas um clássico do cinema mundial. É um filme obrigatório para mentes pensantes, um exercício de filosofia que mudará a visão de mundo do espectador. Extremamente metafórico, encantador e hipnótico, “O Sétimo Selo” não é um simples filme; é um dos trabalhos mais bem construídos de um mestre na arte de assombrar.

Nota: 9,5/10

Mione Le Fay é carioca, formada em Jornalismo. Escritora, professora de informática, apresentadora e produtora de eventos. Apaixonada por livros e fotografias, encontra nesses nessas duas artes uma forma de mostrar tudo o que existe em seu mundo.

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