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Quando Jennifer Lawrence começou a atuar, ninguém (nem ela mesma!) poderia imaginar que sua carreira decolaria de forma tão imensamente meteórica e chegaria no que é hoje. Realmente, ninguém poderia imaginar: Jen começou com um papel pequeno em uma série de TV pequena num canal pequeno, e, quando migrou pro cinema, foi apenas uma figurante em seu primeiro filme. Eis que, em 2010, vem a chance de atuar em um independente, mas poderoso filme, o também pequeno “Inverno da Alma” (Winter’s Bone, no original). Como todos sabem, não é fácil fazer um filme independente (ou simplesmente indie) em qualquer país: o orçamento é pequeno, as filmagens devem ser rápidas e a distribuição será intensamente limitada. Mas “Inverno da Alma” chamou a atenção da crítica e do público, fazendo uma jornada estrondosa desde o Sundance até o Oscar. E isso se deve não somente à atuação perfeita de todo elenco, mas também à direção e roteiro de Debra Granik, que arrancam dos espectadores emoções difíceis e desconfortáveis.

“Inverno da Alma” conta a história de Ree Dolly, uma garota de 17 anos que cuida de sua mãe desequilibrada e de seus irmãos. Todos os dias, Ree cuida da casa, arranja dinheiro e comida para ajudá-los a sobreviver. Um dia, Ree recebe a notícia de que seu pai ausente – um traficante de metanfetamina – está desaparecido e pode ter fugido, e que, se ele não aparecer num tribunal, a família irá perder sua casa. Para impedir que isso aconteça, Ree sai em busca de respostas sobre seu pai e o negócio das drogas, envolvendo-se com a camada mais sombria de sua família.

“Inverno da Alma” é um filme corajoso por dois motivos. O primeiro é que, assim como “Indomável Sonhadora” em 2012, o filme não tem medo de demonstrar que existe pobreza pesada nos Estados Unidos, principalmente no interior – pobreza esta que transforma e corrompe as pessoas, condenando-as a viver em condições desumanas. O segundo é que o filme é uma história de superação que não apela para a pieguisse de outros filmes do gênero (como, por exemplo, os bons, mas forçados “Um Sonho Possível” e “Soul Surfer”), simplesmente deixando-se guiar pelo realismo e o impacto de suas imagens fortes e de seu roteiro cruel.

E que roteiro. Que direção. “Inverno da Alma” é um filme intensamente doloroso de se ver. O sofrimento dos personagens está presente em todas as cenas, mesmo nas que Ree Dolly tenta exibir força diante de situações difíceis. O filme todo é conduzido com imagens de paisagens frias e em silêncio, tornando cada take uma experiência claustrofóbica e sufocante. A jornada de Ree está longe de ser fácil e confortável de se ver, mas é feita de forma tão calma que chega a ser tensa e enervante. Quando chegamos na cruel e repulsiva cena do clímax, não é possível manter-se frio e distante: “Inverno da Alma” nos dá um soco no estomago. E é especialmente triste para nós, espectadores, perceber que este não é um filme sobre uma garota tentando mudar de vida ou sair da pobreza; é um filme sobre uma garota tentando se MANTER na pobreza, por que a única outra possibilidade para ela é ter uma vida pior do que a que já tem.

E as atuações? Magníficas, claro, tanto do elenco principal quanto do coadjuvante. Jennifer Lawrence entrega a melhor performance de sua carreira, e a que lhe rendeu sua primeira indicação ao Oscar. John Hawkes também está especialmente marcante como o protetor de Ree, o que também lhe rendeu uma indicação ao Oscar de Melhor Ator Coadjuvante. Mesmo com um roteiro e uma direção magníficos, as atuações são a real força do filme, o real impacto.

“Inverno da Alma” é um filme que assombra e assusta, uma história de coragem feroz e inesquecível. É um filme que sabe que, para emocionar, não é preciso fazer um grande exagero e se render à pieguisse: basta ser genuíno e verdadeiro em suas emoções. “Inverno da Alma” é angustiante e poderoso em suas cenas, e com certeza deixará uma marca no espectador.

Nota: 8/10
 

Mione Le Fay é carioca, formada em Jornalismo. Escritora, professora de informática, apresentadora e produtora de eventos. Apaixonada por livros e fotografias, encontra nesses nessas duas artes uma forma de mostrar tudo o que existe em seu mundo.

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