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Já falamos neste blog há poucos meses de uma versão recente da Broadway  para esta obra publicada em 1949, onde várias pessoas passavam mal na platéia, incluindo até Jennifer Lawrence, principal atriz de Jogos Vorazes – franquia baseada numa história que também uma distopia.

Mas hoje em tempos de distopias reais, impressiona como vários elementos citados em “1984 por George Orwell”, como um cenário “imaginário de modo absurdo de tão ruim” podem agora soar como “premonições”.

Sendo esta uma das distopias literárias mais famosas no mundo, narrando sobre uma realidade onde um sistema autoritarista, controla tudo e todos. Posso dizer que o que farei será uma análise diferenciada da obra nesta matéria, para quem quiser interpretar assim. Mas a encaro com uma lista de aspectos narrados décadas atrás que mais se assemelham a elementos facilmente observados em nossa realidade cotidiana.

Abordarei alguns pontos chave para reflexão, pois estamos vivendo em um mundo onde pensar e refletir sobre as distopias fictícias se torna cada vez mais oportuno e autoidentificativo. Já desejo abordar este assunto há algum tempo, e suponho ser este um bom momento. Então vou colocar em tópicos, vamos à eles:

*O Big Brother:

Na obra literária em questão, quem está por trás de todo controle é o “Grande Irmão”. Essa “entidade superior”conhecida como Big Brother, na época, servia como uma metáfora de controle do governo sobre tudo aquilo que a população fazia – uma alusão ao grande olho que tudo vê.

Nos dias de hoje, além da óbvia referência televisiva ao reality show que faz sucesso – apesar de mais insólito a cada ano – levando este título, podemos ir além pensando que na nossa realidade as Redes sociais e serviços de busca têm um controle total e absoluto sobre tudo aquilo que as pessoas pesquisam na internet e até sobre o que fazem, uma vez que já se tornou praticamente uma norma social vigente postar sempre atualizações de nossas vidas, atividades e cada acontecimento pessoal na internet.

Sabemos se alguém namora ou se casa, se foi ao trabalho ou está doente, se teve um filho ou foi ao cinema, se está em casa ou em um show, se está viajando ou fazendo compras. TODOS ali adicionados e conectados sabem e podem ter acesso, mesmo com ditas configurações de privacidade. Afinal é para que a coisa serve, pois registrar cada momento fugaz tornou – se uma necessidade. Melhor método de controle não há!

A questao é que este fluxo de informação pode ser usada contra você, pois seu chefe também vai ver, as pessoas que trabalham com você vão saber se você resolveu tirar o dia de folga para dar mais atenção à um filho levando-o ao parquinho. Os amigos de balada vão saber se você resolveu não sair de casa no fim de semana para colocar uma série em dia. A família vai saber se você terminou aquele relacionamento que todo mundo já estava esperando o casamento ser marcado. Quase um “Big Brother coletivo” e ininterrupto.

Ou no mínimo a própria rede social e quem quer que esteja por trás dela vai saber, transformando e criando novas ferramentas “viciantes” para a maioria das pessoas, ou que se tornam facilmente um tipo de OBRIGAÇÃO, um modo de controle comportamental. E que possam induzir as pessoas à comprar mais ou passar mais tempo diante da tela do PC ou do celular. Este inclusive nos últimos anos passou à captar sobre o que você fala nele ou próximo à ele para que também sejam informações usadas para o oferecimento de ofertas e produtos. Eis o verdadeiro BIG BROTHER de George Orwell na vida real.

*Relações Pessoais, que são IMPESSOAIS:

Lendo 1984 vemos que as relações humanas diante dos olhos do Grande Irmão não se dão nunca de modo que envolvam afetividade. As pessoas possuem relações até colaborativas em ambiente de trabalho ou família, mas não vemos no livro a presença de laços afetivos profundos como algo natural, bem visto ou que aconteça facilmente. Pessoas vivem juntas sob extremo clima de desconfiança, onde qualquer coisa dita ou sentida pode ser algo a ser usado contra si. Não há comumente relações carinhosas ou românticas entre nenhum dos personagens, nem mesmo demonstrações de afeto entre casais ou familiares que não tenham de acontecer de modo clandestino. Até pais temem seus próprios filhos. Há trechos onde isto fica claro de um modo que nos faz inevitavelmente comparar com algo que já ouvimos falar ou vimos acontecer

[AVISO DE SPOILER A SEGUIR] Uma das cenas que mais me faz refletir sobre esta questão é quando um personagem – até então temente ao sistema vigente e livre de suspeitas – O’ Brien, que vai parar preso no mesmo local para onde o protagonista Winston Smith é mandado em dado momento da trama, e ao ser perguntado porque está ali responde que a filhinha ainda criança o ouviu dizer que odiava o Grande Irmão enquanto dormia e o denunciou. Sua fala é descrita dita sob um misto de orgulho e tristeza.

Pela própria tortura imposta ao protagonista logo percebemos que não possui objetivo de matar ou causar dano físico, e sim emocional. Vemos que ele só é libertado da punição quando diz preferir que emm seu lugar o mesmo seja feito à Julia – a pessoa com quem possuía uma relação íntima e pessoal, e com quem possuía um laço afetivo. [FIM DO SPOILER] Onde descobrimos que a verdadeira traição ao INGSOC (partido único do regime que governa naquele mundo) não é somente odiar o Grande Irmão, mas sim ter alguém com quem realmente se importa e confia.

Portanto, quando os personagens principais voltam a se reencontrar casualmente em nenhum momento se tenta separa-los, uma vez que eles perderam totalmente o laço de confiança que os unia. Pois não importa para o Grande Irmão se eles convivem ou não, mas o que está em jogo é o quanto sua relação seria suficientemente banal. Tal qual muitas que facilmente encontramos hoje e semelhante a episódios que comumente vivenciamos com cada vez mais frequência. Vivemos em uma realidade cada vez mais fria e funcional, onde verdadeira confiança e real afeição entre pessoas se torna coisa rara no cotidiano. Tal qual era o mundo distópico de George Orwell.

(CONTINUA em “Algumas PREVISÕES distópicas de “1984, George Orwell” – Parte 2…)


Mione Le Fay é carioca, formada em Jornalismo. Escritora, professora de informática, apresentadora e produtora de eventos. Apaixonada por livros e fotografias, encontra nesses nessas duas artes uma forma de mostrar tudo o que existe em seu mundo.

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