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Aviso de Spoilers dos livros da série As crônicas de gelo e fogo

INTRODUÇÃO

Amado e odiado, Rhaegar é com certeza um dos personagens mais enigmáticos e talvez o mais importante de todo o universo de As Crônicas de Gelo e Fogo. Mesmo morto, ele já foi sucessivamente citado em todos os cinco livros das crônicas através dos mais diversos e conflituosos pontos de vistas.

Em minha humilde opinião, o personagem é simplesmente a base na qual se ancora a atual história de Westeros. Suas motivações ou erros parecem estar intrinsecamente relacionadas com os duas facetas da incrível obra de George Martin: o núcleo mágico e o político.

Como veremos mais adiante, o Príncipe de Pedra do Dragão, parecia ser extremamente ligado as profecias que podem estar  relacionadas a temível e misteriosa Longa Noite.

Suas escolhas pessoais precipitaram a trágica queda da poderosa dinastia Targaryen, que governou Westeros por quase 300 anos. O destronamento da Casa Targaryen, da qual ele era o príncipe herdeiro, criou as condições para a acirrada guerra dos tronos que acompanhamos no desenrolar dos cinco volumes lançados até o momento.

E se sabemos muito pouco sobre Rhaegar, sabemos menos ainda sobre Lyanna Stark, a misteriosa irmã de Brandon, Ned e Benjem Stark. Então neste análise/ensaio, pretendo falar um pouco do que sabemos sobre o príncipe Targaryen e Lyanna Stark, já que é impossível tentar ao menos vislumbrar o papel de Rhaegar no enredo de Martin, sem levar em consideração a própria Lyanna Stark, erro que vejo muitos fãs cometendo por aí. Quando o assunto são as motivações de Rhaegar em torno do que ficou conhecido como A Rebelião de Robert ou do Usurpador, muito de Lyanna frequentemente desaparece das análises e Lyanna é simplesmente rotulada e transformada ou em vítima ou numa mulher sem escrúpulos  que fugiu com um príncipe casado.

Basicamente, existe dentro das próprias Crônicas de Gelo e Fogo, duas versões oficiais sobre o que teria levado esse dois personagens a desaparecem tão misteriosamente ao final do ano de 281 d.c, conhecido como o ano da Falsa Primavera, quando um clima mais quente e verde fez com que as pessoas em Westeros erroneamente acreditassem que o inverno havia terminado.

Numa primeira versão, defendida pelos rebeldes que lutaram ao lado de Robert Baratheon, no conflito que ficou conhecida como Rebelião de Robert (ou do Usurpador), Lyanna teria sido sequestrada por Rhaegar e indefesa foi trancada na Torre da Alegria, em Dorne e estuprada até morrer sozinha e abandonada pelo cruel príncipe Targaryen.

Já numa segunda versão, defendida pelos legalistas, que lutaram ao lado de Rhaegar contra Robert durante sua rebelião, os dois teriam fugido para Dorne pois estavam verdadeiramente apaixonados. Pelo menos Rhaegar estava apaixonado.

O problema é que nenhuma dessas duas  versões se encaixam direito com o pouco que já foi dito sobre os dois personagens nos livros. Os poucos fragmentos sobre Lyanna, a deixam bem longe de uma mulher indefesa ou que seria capaz de largar tudo  por amor. Da mesma forma Rhaegar parece estar muito longe da imagem de estuprador que é disseminada no primeiro volume das crônicas, o que de jeito nenhum inviabiliza as duas versões citadas, mas as tornam problemáticas devido as  infinitas lacunas e perguntas não respondidas que deliberadamente são plantadas pelo autor. A verdade é que nenhuma das duas versões parecem inteiramente conclusivas. E só o fato delas serem tão contraditórias é o suficiente para suscitar uma série de questionamentos entre os fãs dos livros.

E se existe uma personagem que conhecemos menos ainda, mas que tem tudo a ver com esse problema, é Elia Martell, esposa de Rhaegar e mãe de seus filhos: Rhaenys e Aegon Targaryen. A única vez que tivemos um vago vislumbre de  Elia em um dialogo , foi através de uma visão de Daenerys, em sua passagem pela Casa dos Imortais, no segundo livro das crônicas, A Fúria dos Reis.

De Elia só sabemos que era boa e tinha uma saúde delicada. O que contribui muito para a construção de uma Elia traída e humilhada pelo marido obcecado por Lyanna Stark . A primeira vista, Elia parece ser somente isso mesmo: A mulher traída, abandonada e culpada pela traição de seu marido e pela tragédia que recaiu sobre o reino.

Mas se prestarmos mais atenção ao pouco que já foi mostrado sobre essa misteriosa mulher, veremos que Elia também pode ser muito mais do que sua fama projeta sobre ela.

Todos os três personagens estão mortos atualmente nos livros, de forma que só temos informações sobre eles a partir do ponto de vista de terceiros. Enxergamos Rhaegar, Elia e Lyanna através da ótica de outros personagens, das impressões que cada um tinha desses personagens, então é necessário muito cuidado ao analisar os variados pontos de vistas que nos fornece informações sobre eles, ainda que seja possível fazer especulações em cima deles. Porém, não podemos tomá-los como que inteiramente confiáveis.

Na série de TV, Elia foi apagada e trucidada pelos roteiristas. Seu casamento foi anulado contrariando todas as leis matrimonias de Westeros que conhecemos (se você levar os livros em consideração) e o nome de seu filho com Rhaegar foi cruelmente dado para o filho de Lyanna com ele. Então, não irei considerar o desfecho parco que a série deu pra esse arco narrativo. Ao invés disso, me voltarei apenas para os livros, local que reside o verdadeira dor de cabeça.

Para começar então, faremos uma análise das duas versões conhecidas na história sobre o relacionamento de Rhaegar e Lyanna. Ao final, trarei uma terceira camada sobre os motivos que poderiam ter levado Rhaegar até Lyanna, aproveitando para destrinchar já nessa primeira parte o pouco que sabemos sobre a personalidade do Príncipe de Pedra do Dragão.  Trago também informações adicionais, de reis e tragédias, que mais tarde poderá nos fornecer um quadro mais geral do contexto no qual Rhaegar, Elia e Lyanna se inseriam.

I- O SEQUESTRADOR E O ESTUPRADOR OBCECADO: A HISTÓRIA ESCRITA PELOS VENCEDORES 

O primeiro volume de As Crônicas de Gelo e Fogo, A Guerra dos Tronos, é seguramente um bom livro para que a gente entenda a versão da história sobre Lyanna, que pinta Rhaegar como seu estuprador e algoz. Embora nosso primeiro contato com Rhaegar venha através de Daenerys, que sustenta na narrativa a versão que seu irmão teria morrido lutando pela mulher que amava (Lyanna), ao final da leitura é a versão de Robert que prevalece sobre Rhaegar.

Robert Baratheon, Senhor da Tempestade, ascendeu ao Trono de Ferro após a Batalha do Tridente, que precipitou a queda da dinastia Targaryen, depois que ele matou Rhaegar num combate singular em 283 d.c (depois da conquista de Aegon, o Conquistador).

Apesar de mulherengo, aparentemente Robert era extremamente apaixonado por Lyanna Stark, que naquela altura era sua prometida. Do seu ponto de vista, Rhaegar havia lhe roubado seu grande amor e por isso Robert nunca conseguiu perdoá-lo.

-Jurei matar Rhaegar pelo o que lhe fez.

-E foi o que Vossa Graça fez – lembrou-lhe Ned.

– Só uma vez –  disse Robert amargamente.

[…]

– Nos meus sonhos mato-o todas as noites – Admitiu Robert. – Mil mortes ainda serão menos do que ele merece. (A Guerra dos Tronos, Eddard, p.36)

Seu ódio por Rhaegar era em Robert algo tão poderoso, que estendeu-se não apenas ao príncipe de Pedra do Dragão, mas também a toda Casa Targaryen, a ponto dele concordar em enviar alguém para assassinar Daenerys e tão pouco se importar com o violento fim que os Lannister deram aos filhos e a esposa de Rhaegar, Elia Martell.

O ódio de Robert pelos Targaryen era nele uma loucura […] Quando protestara que o jovem príncipe e a jovem princesa não eram mais que bebês, o recém coroado rei respondeu: “Não vejo bebês. Somente filhotes de dragão.” (A Guerra dos Tronos, Eddard, p.85)

E é através de Robert que conhecemos melhor a versão de que Rhaegar teria levado Lyanna a força e a violentado incontáveis vezes.

E Rhaegar… quantas vezes acha que ele violou sua irmã? Quantas centenas de vezes? – sua voz tornara-se tão alta que o cavalo que montava relinchou nervosamente. O rei puxou as rédeas com força, sossegando o animal, e apontou um dedo irado para Ned.  – Matarei cada Targaryen em que puser as mãos até estarem tão mortos como os seus dragões, e então mijarei em suas tumbas. (A Guerra dos Tronos, Eddard, p.85)

Robert morreu apaixonado por Lyanna e seu amor por ela foi uma sombra sobre o seu casamento com Cersei Lannister, que nasceu de um arranjo político, mas que Robert nunca pareceu ter se esforçado para que desse certo.

E Cersei…devo-a Jon Arryn. Não tinha desejo de casar depois de Lyanna me ter sido roubada, mas Jon disse que o reino precisava de um herdeiro. (A Guerra dos Tronos, Eddard, p.221)

Porém, é através de Ned  que começamos a perceber que na verdade, Robert amava uma Lyanna idealizada, que não existia de verdade, estando muito longe de parecer a garota indefesa das canções que ele cantava para si mesmo.

Não chegou a conhecer Lyanna como eu conheci, Robert. Você viu sua beleza, mas não o ferro que tinha por baixo. (A Guerra dos Tronos, Eddard, p.220)

Além de tudo, não foram poucas as vezes nos livros, em que Arya Stark foi comparada com sua tia há muito tempo morta, Lyanna Stark. E quem é fã das crônicas ou mesmo da série da TV, sabe o quão reveladora é essa observação, já que Arya é conhecida como uma garota decidida, voluntariosa, corajosa e dona de si mesma.

-Ah, Arya. Tem um ardor dentro de si, criança. Meu pai costumava chamá-lo “o sangue de lobo”. Lyanna tinha um pouco, e meu irmão Brandon mais que um pouco. E isso levou a ambos a uma morte precoce – Arya ouviu tristeza na voz dele; não era frequente que falasse do pai ou do irmão e da irmã que tinham morrido antes de ela nascer. – Lyanna poderia ter usado uma espada, se o senhor meu pai o tivesse permitido. Você por vezes faz com que me lembre dela. Até se parece com ela.

-Lyanna era linda – disse Arya, surpresa. Todos afirmava aquilo. E não era algo que alguma vez se dissesse de Arya.

-Era mesmo – concordou Eddar Stark – linda e voluntariosa, e morta antes do tempo. (A Guerra dos Tronos, Arya, p. 161. Negritos meus)

Na passagem à baixo, Bran ver Lyanna brincando de espadas com Benjen Stark e a confunde inicialmente com Arya.

Agora, duas crianças brincavam pelo bosque sagrado, gritando uma para a outra enquanto duelavam com galhos quebrados. A garota era a mais e mais alta dos dois. Arya!, Bran pensou, ansiosamente, enquanto a observava saltar de uma pedra e acertar o garoto. Mas isso não estava certo. Se a garota era Arya, o menino seria Bran e ele nunca usara um cabelo tão comprido. E Arya nunca me bateu brincando de espadas, do jeito que a garota está batendo nele. Ela o acertou na coxa com tanta força, que ele perdeu o equilíbrio e caiu na lagoa, começando a se debater e a gritar.

-Fique quieto, estúpido – disse a garota, jogando seu próprio galho de lado. – É só água. Quer que a Velha Ama escute e vá correndo contar ao pai? – Ela se ajoelhou e puxou o irmão da lagoa, mas antes que ele tivesse saído completamente, os dois desapareceram. (A Dança dos Dragões, Bran, p.395)

Lyanna também gostava de montar. Guardem esse trecho com carinho, pois futuramente voltarei a falar sobre ele.

-Monta como um nortenho, senhora – disse Harwin quando a obrigou a parar. – sua tia também era assim. A Senhora Lyanna. (A Tormenta de Espadas, Arya, p.182)

***

Cavalos…o garoto era louco por cavalos, a Senhora Dustin lhe contará. Nem mesmo a filha de Lorde Rickard conseguia derrotá-lo, e aquela uma é meio cavalo. (A Dança dos Dragões, Fedor, p.371)

Prometida a Robert Baratheon, Lyanna não parecia muito animada com a perspectiva de casar-se com o Senhor da Tempestade, notavelmente conhecido por seu lado mulherengo.

“Robert nunca se limitará a uma cama”, dissera-lhe Lyanna, havia muito tempo em Winterfell, na noite em que o pai prometera a mão da filha ao jovem Senhor de Ponta Tempestade. “Ouvi dizer que fez um filho em uma moça qualquer do Vale”. Ned segurou o bebê nos braços, dificilmente poderia negá-lo, e tão pouco mentiria à irmã, mas assegurou-lhe que o que Robert fizera antes da promessa não tinha importância, que era um homem bom e fiel, e que a amaria de todo o coração. Lyanna apenas sorrira. “O amor é doce, querido Ned, mas não pode mudar a natureza de um homem.” (A Guerra dos Tronos, Eddard, p. 270)

Logo no primeiro volume, somos apresentados a um Robert gordo, beberrão, mole, mulherengo,  cheio de bastardos e consumido por sua função de rei, a qual ele cumpria muito mal e de que aparentemente não gostava, apesar do esforço em erradicar os últimos Targaryen que na perspectiva dele ameaçavam com razão o trono de ferro no qual ele estava sentado. O trono conquistado com seu martelo de guerra, porém legitimado devido ao seu grau de parentesco com os Targaryen, sendo ele um primo de segundo grau do rei Aerys II.

Entretanto, o Robert anterior ao Trono de Ferro, é frequentemente descrito como um homem forte, desejado de Dorne a Muralha pelas donzelas de Westeros, um homem carismático e popular, que ocupava todos os espaços onde chegava, que adorava estar sobre um cavalo e com um martelo de guerra nas mãos. Os dois Robert possuem em comum o gênio explosivo e tempestuoso, mas o Robert do Trono de Ferro tornou-se fraco e aparentemente exatamente o que ele sempre acusou Rhaegar de ser: um estuprador. E descobrimos isso quando Martin finalmente nos permite conhecer melhor Cersei Lannister, através de seus capítulos em O Festim dos Corvos.

Aquelas tinham sido as piores noites, em que jazia impotente debaixo dele enquanto ele se satisfazia, fedendo a vinho e grunhindo como um javali. Normalmente rolava de cima dela e adormecia assim que terminava, e já ressonava antes de sua semente ter tempo de secar nas coxas de Cersei. Depois, ficava sempre dolorida, em carne viva entre as pernas, com os seios machucados pelos maus-tratos que ele lhe dava. A única vez que a deixara molhada fora a na noite do casamento.

[..]

Bem lá no fundo, Robert Baratheon era um covarde. Com o passar do tempo, os ataques foram se tornando menos frequentes […] Nunca tinha parado por completo, contudo. Mais cedo ou mais tarde chegaria sempre a noite em que beberia demais e viria reclamar seus direitos. O que o envergonhava à luz do dia dava-lhe prazer na escuridão. (O Festim dos Corvos, Cersei, p.414)

Um outro personagem que nos permite relativizar a personalidade de Robert, ou pelo menos no que ele se transformou e acredita que aconteceu com Lyanna, é o próprio Ned Stark, irmão de Lyanna e a última pessoa a estar com ela em vida.

Eu estava com ela quando morreu – lembrou Ned ao rei. – Queria regressar à nossa casa, para descansar ao lado de Brandon e do pai –  por vezes ainda conseguia ouvi-la. Prometa-me, suplicara, num quarto que cheirava a sangue a rosas. Prometa-me, Ned.  (A Guerra dos Tronos, Eddard, p.36)

Diferentemente de Robert, Eddard é conhecidamente um homem mais comedido e pragmático e mesmo tendo o pai, o irmão e a irmã mortos a partir do suposto rapto de Lyanna, Ned não aparenta nutrir nem um terço do rancor que Robert sentia pelos Targaryen, sobretudo por Rhaegar.

Por ser um personagem estritamente ligado a honra, isso de certa forma o faz um homem que se ressente fácil com coisas que não considera um ato honroso. A anuência de Robert diante do brutal assassinato dos filhos de Rhaegar com Elia fez com os dois homens parassem de se falar, precisando a morte de Lyanna para uni-los novamente. Da mesma forma, Ned abandonou seu cargo de Mão do rei, quando Robert cogitou enviar assassinos para dar cabo de Daenerys Targaryen, que naquele momento, esperava um filho de Khal Drogo.

Além do mais, Ned nunca perdoou Jaime Lannister pelo assassinato do rei Aerys Targaryen, pois Jaime era um cavaleiro juramento da Guarda Real e portanto, tinha a função de proteger o rei. Segundo o próprio Jaime, Ned o julgou assim que o viu, nunca sequer considerando os motivos que o levaram a assassinar o Rei Louco, que mais tarde sabemos, foi para salvar a vida das dezenas de pessoas em Porto Real que Aerys II queria matar com fogo vivo.

Porém, é digno de nota o posicionamento dúbio de Ned em relação ao Príncipe de Pedra do Dragão, que segundo seu amigo, teria cometido um ato tão desonroso, que pesa ainda mais quando pensamos que ele seria o futuro rei de Westeros se tivesse sobrevivido.

– Nos meus sonhos mato-o todas as noites – Admitiu Robert. – Mil mortes ainda serão menos do que ele merece.

Não havia nada que Ned pudesse responder àquilo. (A Guerra dos Tronos, Eddard, p.36)

Se Ned não o defende, ele também não o julga e considera o ódio de Robert pelo Targaryen loucura, mesmo sendo a sua família a maior prejudicada pela “conduta de Rhaegar”. Ned claramente se sente incomodado em falar sobre Lyanna, atribui a sua personalidade parte da culpa por sua morte e foi a última pessoa a estar na presença dela, que morrera em seus braços depois de fazê-lo prometer algo. Talvez este algo, como sabemos, possa ter  a ver com Jon Snow, sendo o motivo pelo qual Ned é simplesmente evasivo, quando o assunto é Rhaegar Targaryen.

Todavia, em um de seus capítulos em A Guerra dos Tronos, quando Ned vai a um bordel para conhecer a filha bastarda que Robert teve com uma jovem prostituta de Porto Real, secretamente ele compara a personalidade entre o seu rei e o príncipe Targaryen, num momento que já começava a se questionar o quanto o seu melhor amigo havia se transformado.

Pela primeira vez em anos, deu por si pensando em Rheagar Targaryen. Gostaria de saber se Rhaegar frequentava bordéis, não sabia nem porquê, mas achava que não. (A Guerra dos Tronos, Eddard, p. 271)

Além de ser um pouco estranho o personagem admitir que não pensava há anos no homem que “supostamente” arruinou parte de sua família, estuprando sua irmã, deixando-a numa torre para morrer e desencadeado a morte de seu pai e irmão.  Uma coisa é Ned não gostar de falar sobre o assunto, outra coisa é bem diferente é ele admitir que não pensa em Rhaegar com frequência. Fora que nunca é explicado exatamente, qual foi a versão que Ned contou sobre a morte de Lyanna, que fora encontrada por ele numa cama de sangue, que em Westeros é sinônimo de cama de parto, detalhe este que claramente o personagem omitiu sobre a morte de sua irmã. Mais uma vez talvez por causa de Jon Snow se você for um adapto da equação R+L=J.

Desta maneira, sem perder de vista o nosso objetivo, é necessário fazer algumas considerações dos motivos que poderiam levar Ned a manifestar esse tipo de comportamento em relação Rhaegar:

    • Ele sabe que Lyanna e Rhaegar são os pais verdadeiros de Jon Snow e seu silêncio é uma forma de protegê-lo contra o ódio de Robert contra os Targaryens e consequentemente proteger os seus próprios filhos legítimos;
    • Lyanna mesmo tendo sido vítima, pediu para que Ned esquecesse os pecados de Rhaegar e se concentrasse em proteger seu filho que não tinha culpa de nada;
    • Lyanna contou a Ned que não foi sequestrada por Rhaegar, mas foi com ele de boa vontade, ainda que isso tenha sido uma mentira que ela contou para estimulá-lo a proteger seu filho de Robert;
    • Rhaegar não teve nada a ver com o desaparecimento de Lyanna Stark e nem com sua suposta gravidez;
  • Lyanna contou a Ned que foi de boa vontade e usou algum argumento muito poderoso para convencê-lo e consequentemente arrefeceu qualquer sentimento mais duro e rancoroso que o honrado Ned pudesse ter em relação a Rhaegar.

Embora seja possível, a própria estrutura narrativa da história torna pouco provável que Rhaegar não exerceu algum tipo de participação no desaparecimento de Lyanna, mesmo que indiretamente e sem a intenção. Então levando em consideração o amor de Ned por atitudes honradas, talvez Lyanna o tenha persuadido com um motivo muito forte, para além do fato de proteger a vida de Jon e quem sabe até mesmo sugerindo que Ned o tomasse como um bastardo seu. Isso  talvez justifique porque na frase a baixo, temos a sensação de que Ned, diferentemente de Robert, não torna Lyanna vítima de sua própria tragédia, mas de uma forma sutil a culpa pela “imprudência” de suas escolhas.

Ah, Arya. Tem um ardor dentro de si, criança. Meu pai costumava chamá-lo “o sangue de lobo”. Lyanna tinha um pouco, e meu irmão Brandon mais que um pouco. E isso levou a ambos a uma morte precoce. (A Guerra dos Tronos, Arya, p. 161. Negritos meus)

Cersei Lannister, apesar de ser uma personagem controversa e alguém que odeia a todos exceto ela mesma, exprime um surpreendente respeito por Rhaegar, além de nutrir uma secreta paixão por ele, chegando a lamentar-se por ter casado com Robert, ao invés de Rhaegar, conforme seu pai – Twyn Lannister – desejava inicialmente, antes de ter o pedido negado pelo pai de Rhaegar, o rei Aerys II.

-[..]Seu pai encontrará outro homem para você, um homem melhor do que Rhaegar.

Contudo, a tia mentira, e o pai falhara com ela, tal como Jaime estava falhando agora. O pai não encontrou homem melhor. Em vez disso, deu-me Robert [..] Se ao menos tivesse casado com Rhaegar, como os deuses pretendiam, ele nunca teria olhado duas vezes para a pequena loba. Rhaegar hoje seria o nosso rei, e eu seria sua rainha, a mãe de seus filhos.

Nunca perdoara Robert por tê-lo matado. (O Festim dos Corvos, Cersei, p.314)

Príncipe Rhaegar Targaryen
Fonte: deviantart.com

Comparado com Rhaegar, até seu belo Jaime não parecera não ser mais do que um rapazinho imberbe. (O Festim dos Corvos, Cersei, p.313)

***

Robert era bastante atraente quando se casaram, alto, forte e poderoso, mas seus cabelos eram negros e pesados, os pelos eram densos no peito e grossos em volta do sexo. Foi o homem errado que regressou do Tridente, pensava por vezes a rainha enquanto ele abria caminho através de seu corpo. Nos primeiros anos, quando a montava com mais frequência, fechava os olhos e fingia que Robert era Rhaegar. Não conseguia fingir que Jaime, era muito diferente, era-lhe estranho demais. Até seu cheiro era errado. (O Festim dos Corvos, Cersei, p.414)

Os pontos de vistas de Cersei não são confiáveis. Ela é vaidosa, frequentemente distorce as coisas e tinha Rhaegar como um modelo de beleza e comportamento, conforme podemos perceber na parte que ela compara Rhaegar até mesmo com Jaime. Ela se ressentia por não ter sido sua rainha.

Porém, é possível vê-la fazendo o mesmo movimento que Ned Stark, uma fonte consideravelmente mais confiável ou pelo menos mais sólida.

Como Ned, Cersei usa Rhaegar como um parâmetro para medir Robert, ironicamente, substituindo Robert por Rhaegar em alguns momentos. Nós nunca tivemos o ponto de vista de Robert, mas pelos seus diálogos com Eddard, era possível perceber que de certa forma Robert fazia o mesmo com Cersei, comparando-a com Lyanna. A Lyanna que ele idealizava, como Cersei muito provavelmente idealizava Rhaegar.

-A mulher tentou me impedir de participar do corpo a corpo. Agora está amuada no castelo, maldita seja. Sua irmã nunca teria me envergonhado assim.

-Não chegou a conhecer Lyanna como eu conheci, Robert. Você viu sua beleza, mas não o ferro que tinha por baixo. Ela teria lhe dito que não tem nada a fazer no corpo a corpo. (A Guerra dos Tronos, Eddard, p.220)

Todavia, o interessante nisto tudo é perceber que o comportamento de Robert retratado por Cersei, prova sim que um homem antes “de bem”, pode assumir cores mais sombrias, a ponto de tornar-se um estuprador. Por outro lado, isso levanta também  uma série de questionamentos sobre a veracidade dos fatos contados por Robert Baratheon.

E talvez de uma forma mais importante, isso sinaliza que nem Robert e nem Cersei, conheceram exatamente a verdadeira natureza por detrás das personalidades de Rhaegar e Lyanna.

Levando em consideração a amargura de Robert, sua insatisfação com a vida, com o trono e consequentemente com Cersei, podemos especular se as palavras que Robert dizia sobre Lyanna era mesmo o que ele sentia sobre ela. Seu discurso furioso e sua insistência de tornar Lyanna uma vítima de Rhaegar, parece ter raízes na visão romantizada que ele tinha de sua prometida.

Para um homem que é frequentemente descrito como orgulhoso, querido e desejado, talvez fosse mais insuportável saber que seu amor não era correspondido, do que aceitar ou pelo menos cogitar a possibilidade de que Lyanna teria ido com Rhaegar espontaneamente.  Se por um lado isso não desqualifica seu ponto sobre o estupro, por outro nos permite especular se o verdadeiro motivo por trás da fúria de Robert, não foi uma categórica rejeição de Lyanna que ao fugir com outro homem perante todo ao reino, humilhou Robert diante de todos.

-Sempre fui forte…ninguém conseguia me enfrentar, ninguém. Como se luta com alguém em quem não se pode bater? – confuso, o rei balançou a cabeça. – O Rhaegar…O Rhaegar ganhou, maldito seja. Matei-o, Ned, enterrei o espigão naquela armadura negra, espetei-o em seu coração negro, e ele morreu aos meus pés. Fizeram canções sobre isso… Mas de algum modo ele conseguiu ganhar. E agora tem Lyanna, e eu tenho ela – o rei esvaziou o copo. (A Guerra dos Tronos, Eddard, p.305)

A história tende sempre a ser contada pelos vencedores e o vencedor (a primeira vista) da rebelião foi Robert, de modo que prevaleceu a versão dele dos fatos,  sendo mais fácil para Robert explicar toda a situação como sequestro seguido de estupro, do que aceitar que sua perfeita Lyanna talvez tenha preferido Rhaegar, um homem casado, ao invés dele, a quem era prometida. Sentimento este que o arruinou.

II- AMADO E RESPEITADO, ELE FEZ TUDO POR AMOR

– Também conheceu meu irmão Rhaegar?

– Dizia-se que homem algum chegou a conhecer realmente o Príncipe Rhaegar.  (A Tormenta de Espadas, Daenerys, p.88)

Eu acredito que essa fala de Sor Barristan, talvez tenha sido a frase mais sábia sobre o Rhaegar em todas as crônicas. Monstra que esse personagem é um enigma não apenas para nós como também para todo esse universo construído.

Se entre os vencedores da Rebelião de Robert, prevalece a noção de um Rhaegar estuprador, apesar das pistas destoantes como tentei demonstrar a cima. Por outro, persiste a versão dos derrotados. Dos legalistas Targaryen que lutaram ao lado de Rhaegar.

A primeira vez que ouvimos que Rhaegar teria morrido lutando pela mulher que amava, foi com a própria Daenerys, sua irmã. E esse foi o primeiro vislumbre que tivemos  desse misterioso e intrigante personagem.

[…] por vezes, Dany conseguia visualizar os acontecimentos, tantas tinham sido as ocasiões em que ouvira o irmão contar as histórias. A fuga no meio da noite para Pedra do Dragão, com o luar cintilando nas velas negras do navio. Seu irmão Rhaegar, combatendo o Usurpador nas águas sangrentas do Tridente e morrendo pela mulher que amava. (A guerra dos tronos, Daenerys, p.26 – negritos meu)

Daenerys passou a vida no exílio, ouvindo as histórias românticas e duvidosas que Viserys contava sobre os Sete Reinos de Westeros.

Como Cersei, Viserys certamente não é uma fonte confiável e por vários motivos. Primeiro que ele tinha por volta de oito anos quando fugiu para exílio, segundo que ele mesmo cresceu ouvindo as versões da rebelião contada pelos lealistas Targaryens e terceiro porque ele era meio louco.

Porém, a medida que a história foi se expandido, acompanhamos esse mesmo relato aqui e ali, na maioria das vezes com personagens que conferem um pouco mais de legitimidade ao fato e neste sentido, Sor Barristan Selmy, o ex Comandante da Guarda Real de Westeros, tornou-se uma fonte preciosa sobre Rhaegar. Ainda que não 100% confiável, vale dizer.

[…] Daenerys Targaryen amava seu capitão, mas essa era a garota nela, não a rainha. O Príncipe Rhaegar amou sua Senhora Lyanna, e milhares morreram por isso. (A Dança dos Dragões, O Derrubador de Reis, p. 741 – negritos meus)

É Barristan que nos permite vislumbrar em primeiro lugar, traços mais substanciais da personalidade de Rhaegar.

– Sei pouco de Rhaegar. Só as histórias que Viserys contava, e ele era um garotinho quando nosso irmão morreu. Como ele era realmente?

– Capaz. Isso acima de Tudo. Determinado, circunspecto, cumpridor, obstinado. Conta-se uma história sobre ele… mas sem dúvida Sor Jorah também a conhece.

– Gostaria de ouvi-la de você.

– Às suas ordens – disse Barba-Branca. – Quando criança, o Príncipe de Pedra do Dragão era extraordinariamente dado á leitura. Começou a ler tão cedo que os homens diziam que a Rainha Rhaella devia ter engolido alguns livros e uma vela enquanto ele estava em seu ventre. Rhaegar não tinha nenhum interesse pelas brincadeiras das outras crianças. Os meistres ficavam assombrados com sua inteligência, mas os cavaleiros do pai trocavam gracejos amargos sobre Baelor, o Abençoado, ter renascido. Até que um dia o Príncipe Rhaegar encontrou algo em seus pergaminhos que o mudou. Ninguém sabe o que pode ter sido, só se sabe que o garoto apareceu no pátio uma manhã, no momento em que os cavaleiros vestiam as armaduras. Foi direto a Sor Willem Darry, o mestre de armas, e disse: “Vou precisar de espada e armadura. Parece que tenho que ser um guerreiro.” (A Tormenta de Espadas, Daenerys, p. 89)

Príncipe Rhaegar lutando no Tridente

A perícia do Príncipe Rhaegar era inquestionável, mas ele raramente entrava nas liças. Nunca gostou da canção das espadas, como Robert ou Jaime Lannister gostavam. Era algo que tinha que fazer, uma tarefa que o mundo tinha lhe atribuído. Desempenhava-a bem, pois fazia tudo bem. Era essa sua natureza. Mas não tirava dela nenhuma alegria. Os homens diziam que Príncipe Rhaegar gostava muito mais da harpa do que da lança. (A Tormenta de Espadas, Daenerys, p. 445)

Assim vai se resgatando a imagem de um homem educado, culto, sensível capaz, inteligente, bom com as espadas, misterioso, introvertido , obstinado e melancólico…

De noite, o príncipe tocou a harpa de prata e a fez chorar. Quando lhe foi apresentada, Cersei quase se afogou nas profundezas de seus tristes olhos púrpura. Ele foi machucado, lembrava-se de ter pensado. (O Festim dos Corvos, Cersei, p.313)

***

[..] -Mas não tenho certeza de que Rhaegar tivesse a capacidade de ser feliz.

– Faz com que pareça tão amargo – protestou Dany.

– Amargo, não, não, mas…havia uma melancolia no Príncipe Rhaegar, um sentido… – o velho voltou a hesitar.

-Diga –  pediu ela. – Um sentido…?

– …de tragédia. Ele nasceu em pesar, minha rainha, e essa sombra pairou sobre ele durante toda a vida.  (A Tormenta de Espadas, Daenerys, p.445)

Aclamado e honrado…

Tinha dez anos quando finalmente viu seu príncipe em carne e osso, no torneio que o senhor seu pai organizara para dar as boas-vindas ao oeste ao Rei Aerys. Bancadas tinham sido erguidas por baixo das muralhas de Lanisporto, e as aclamações do povo ecoavam no Rochedo Casterly como trovões. Eles aclamaram o pai com o dobro da força com que aclamaram o rei, recordou a rainha, mas só com a metade da força com que aclamaram o Príncipe Rhaegar. (O Festim dos Corvos, Cersei, p.313)

***

– Não havia honra maior do que receber o grau de cavaleiro das mãos do Príncipe de Pedra do Dragão. (A Tormenta de Espadas, Daenerys, p.254)

Frequentemente descrito como a grande esperança do reino , Rhaegar era respeitado e até mesmo temido por homens poderosos como Twyn Lannister que até aonde sabemos só decidiu-se pelo Saque de Porto Real, depois que ele morreu no Tridente.

-Meu pai mantivera-se afastado da guerra, remoendo todas as desfeitas que Aerys tinha feito a ele e determinado a ver a Casa Lannister do lado dos vencedores. O Tridente decidiu-o. (A Tormenta de Espadas, Jaime, p. 387)

***

[…] Para Leste temos os Arryn, Stannis Baratheon ocupa Pedra do Dragão e , no sul, Jardim de Cima e Ponta Tempestade convocam os vassalos.

Tyrion deu um sorriso torto.

-Anime-se pai. Pelo menos Rhaegar Targaryen continua morto. (A Guerra dos Tronos, Tyrion, p.541)

Através de um sonho, descobrimos que Jaime Lannister parece nutrir um genuíno remorso em relação a Rhaegar, já que ele matou seu pai, o Rei Aerys II, e consequentemente não protegeu a esposa e os filhos de Rhaegar, que foram massacrados durante o Saque de Porto Real.

O Príncipe Rhaegar ardia com uma luz fria, ora branca, ora vermelha, ora escura.

-Eu deixei minha esposa e meus filhos em suas mãos.

-Nunca pensei que ele lhes fariam mal. – A espada de Jaime agora emitia menos luz. – Eu estava com o rei… (A Tormenta de Espadas, Jaime, p.464)

Daenerys o homenageou duas vezes ao longo da história. Primeiro no nome de seu filho com Khal Drogo, e depois com um de seus dragões.

O verde será Rhaegal, em homenagem ao meu valente irmão, que morreu nas margens verdes do Tridente.  (A Fúria dos Reis, Daenerys, p.127)

Rhaegar é frequentemente usado por Sor Jorah e Sor Barristan, para elogiar Dany.

Com certeza, sou apenas uma garotinha e pouco sei de guerra. O que acham, senhores?

-Acho que é irmã de Rhaegar Targaryen – disse Sor Jorah com um meio sorriso tristonho.

– Sim – disse Arstan Barba-Branca -, e também uma rainha. (A Tormenta de Espadas, Daenerys, p.441)

Ele mantinha em seu círculo de confiança os cavaleiros mais honrados dos Sete Reinos, inclusive Sor Arthur Dayne, A Espada da Manhã. Simplesmente um dos cavaleiros mais reverenciado da história de Westeros.

O escudeiro do Príncipe Rhaegar foi Myles Moonton, e depois Richard Lonmouth. Quando ganharam suas esporas, foi ele mesmo quem os armou cavaleiros, e permaneceram companheiros próximos. O jovem Lorde Connington também era caro ao príncipe, mas seu amigo mais antigo era Arthur Dayne. (A Tormenta de Espadas, Daenerys, p.88)

Jon Conington aparenta nutrir uma sincera queda pelo Príncipe de Pedra do Dragão.

Outros poderiam dizer que o reino foi perdido quando o Príncipe Rhaegar caiu sob o martelo de guerra de Robert, no Tridente, mas a Batalha do Tridente, nunca teria sido travada se o grifo tivesse matado o veado no Septo da Pedra. Os sinos dobraram por todos nós naquele dia. Por Aerys e sua rainha, por Elia de Dorne e sua filhinha, por todo homem verdadeiro e mulher honesta dos Sete Reinos. E por meu príncipe de prata. (A Dança dos Dragões, O Senhor Perdido, p.267, negritos meus)

Assim como Sor Barristan, Jon Conington lutou ao lado dos Targaryen na Rebelião de Robert. Porém o interessante desse grupo, que relaciona diferentes pontos de vistas, é que ele nos revela aspectos importantes da personalidade de Rhaegar e como os mais variados personagens se sentem em relação a ele, de modo que não temos apenas o ódio de Robert como parâmetro.

Rhaegar despertava também amor, desejo, devoção, respeito, honra, esperança e deixava nas pessoas uma profunda sensação de mistério e melancolia.

Todos esses relatados são depoimentos importantíssimos, pois são eles que permite com que os leitores confrontem os depoimentos queixosos de Robert.

Príncipe Rhaegar e sua harpa

Todavia, não podemos em nenhum momento esquecer que são relatos feitos a partir das expectativas de cada um desses personagens. São observações externas ao personagem. Novamente era como as pessoas enxergavam Rhaegar e ainda que revele um fundo verdadeiro, particularmente eu não acho que Rhaegar “sequestrou Lyanna” porque estava simplesmente apaixonado por ela. Da mesma forma que eu não acredito que Rhaegar “sequestrou” Lyanna porque tinha um desejo bizarro por ela. São duas possibilidades possíveis, mas que a própria estrutura narrativa dos livros se esforça para colocar em cheque… e quando você olha com mais atenção, essas duas versões simplesmente não encaixam por si só.

E com este análise/ensaio, quero mostrar que a grande questão com esses personagens, não é exatamente o que eles foram, mas o que eles fizeram. Suas ações  e o meio no qual eles estavam inseridos.

Neste ponto, precisamos falar sobre meistre Aemon e a relação de Rhaegar com a profecia do Príncipe que foi Prometido.

III – PROFECIAS E O DESTINO DE UMA CASA

Enquanto muitos em Westeros acreditam que Rhaegar sequestrou Lyanna porque estava apaixonado ou porque só queria satisfazer os seus desejos, através de meistre Aemon vai se descortinando uma nova camada do Príncipe de Pedra do Dragão, que acrescenta mais um elemento de mistério em torno desse personagem.

Meistre Aemon é nada mais nada menos do que filho do rei Maekar Targaryen e irmão do rei Aegon V, o Egg dos contos O Cavaleiro dos Sete Reinos, e o que podemos chamar de tio-avô de Rhaegar, Viserys e Daenerys.

Aemon Targaryen, em sua condição de meistre, é um dos personagens mais carismáticos de todas as crônicas, além de ser o personagem que Martin se esforça para construir a fama de homem mais sábio dos Sete Reinos.

Durante O Festim dos Corvos, em seus momentos finais de vida, o velho senhor revela ao leitor que manteve contato com Rhaegar durante um tempo e que acreditava que Rhaegar era na verdade o principal elemento de uma profecia já há muito tempo profetizada. A profecia do Príncipe que foi Prometido.

Quem é leitor das crônicas sabe o quanto as profecias são importantíssimas para o desenvolvimento da trama, talvez não seja exagero dizer que as profecias sejam a grande força motriz que move praticamente todo o enredo do mundo de gelo e fogo. Ela não engloba apenas palavras proferidas em forma de enigmas, mas sonhos e visões que se colocam como pistas para o leitor em relação aos grandes mistérios que permeiam a narrativa.

Desde o segundo volume, A Fúria dos Reis, temos conhecimento de uma antiga profecia, muito conhecida pelos sacerdotes vermelhos de R’hollor: a profecia de Azor Ahai. Um herói renascido do sal e da fumaça, que guiaria o mundo na luta contra o grande mal representado pelo O Outro, o grande inimigo do deus vermelho, R’hollor, durante a Longa Noite.

Conhecemos essa profecia por meio de um dos capítulos de Davos, que se passam inicialmente em Pedra do Dragão, e através de Melissandre de Asshai, a sacerdotisa vermelha que acredita que Stannis Baratheon é na verdade, Azor Ahai renascido.

O velho meistre olhava para Stannis e via apenas um homem. Você vê um rei. Ambos se enganam. Ele é o escolhido do Senhor, o guerreiro do fogo. Vi-o à frente da luta contra a escuridão, vi-o nas chamas. As chamas não mentem, caso contrário você não estaria aqui. Isso também está escrito na profecia. Quando a estrela vermelha sangra e as trevas reúnem forças, Azor Ahai renascerá por entre fumaça e sal, para acordar dragões da pedra.  (A Tormenta de Espadas, Davos, cap. 25)

O mito de um herói surgindo e salvando o mundo durante uma longa escuridão, não era até então, algo desconhecido do enredo, já que o conhecemos logo no primeiro volume, A Guerra dos Tronos, através das histórias da Velha Ama com a história do Último Herói.

Porém é no segundo livro, A Fúria dos Reis, que finalmente ouvimos falar de Azor Ahai e mais tarde descobrimos que esse lendário herói e o Príncipe Prometido são na verdade a mesma  figura.

Nunca ninguém procurou uma garota – dissera – Fora um príncipe a ser prometido, não uma princesa. Rhaegar, pensava eu… a fumaça era do incêndio que devorou Solarestival no dia do seu nascimento, o sal vinha das lágrimas derramadas por aqueles que morreram. Ele partilhou minha crença quando era mais novo, mas mais tarde persuadiu-se de que seria o filho a cumprir a profecia, pois um cometa foi visto no céu de Porto Real na noite em que Aegon foi concebido, e Rhaegar tinha certeza de que a estrela sangrando era um cometa. (O Festim dos Corvos, Samwell, p. 447, negritos meus).

Então sabemos que Azor Ahai e o Príncipe Prometido se referem ao mesmo “mito”  e profecia e que Rhaegar tinha conhecimento disso pois o próprio meistre Aemon, acreditava que ele era o herói profetizado, e durante um tempo, o próprio Rhaegar compartilhou dessa crença.

A) – A sombra de Solarestival

Para entendermos a relação de Rhaegar com a profecia do Príncipe que foi Prometido, temos que levar em consideração dois fatores essenciais de sua caracterização: a relação dos Targaryen com as profecias e o momento de seu nascimento.

Os Targaryen são a única família nobre da velha Valíria que sobreviveu à Perdição, evento catastrófico que engoliu toda essa civilização em questão de minutos.

A salvação da família ocorreu porque Daenys, a Sonhadora; tivera um sonho profético, no qual toda Valíria era destruída. Assim, sob muita chacota de seus conterrâneos, os Targaryen partiram de Valíria e se estabeleceram em Pedra do Dragão, que há muito tempo já era um interposto valiriano no ultramar.

O desdobramento desses eventos todos conhecemos: Valíria desapareceu em um mar de chamas, os Targaryen e seus dragões prosperaram em Pedra do Dragão e com Aegon, o Conquistador e suas irmãs/esposas, Visenya e Rhaenys,  estabeleceram uma dinastia que durou quase 300 anos em Westeros.

Toda a linhagem fora salva devido a um sonho profético, os chamados sonho de dragão, algo que se repetiu durante as infinitas gerações que sucederam Daenys, a Sonhadora.

– O último dragão morreu antes de ter nascido – Sam respondeu. – Como é possível que se lembre dele?

Vejo-os nos meus sonhos Sam. Vejo uma estrela vermelha a sangrar no céu. Ainda me lembro do vermelho. Vejo suas sombras na neve, ouço o estalar de asas de couro, sinto o seu bafo quente. Meus irmãos também sonhavam com dragões, e os sonhos mataram todos eles. Sam, nós estremecemos à beira de profecias meio recordadas, de maravilhas e terrores que nenhum homem vivo hoje pode esperar compreender… (O Festim dos Corvos, Samwell, p. 331).

A própria Daenerys teve um sonho de dragão, de natureza profética e perturbadora, tempos antes de entrar na pira de Drogo e chocar seus ovos de dragão.

Como que em resposta, ouviu um hediondo som de rasgar e o crepitar de um grande fogo. Quando voltou a olhar, Viserys tinha desaparecido, grandes colunas de chamas erguiam por toda parte e no meio delas, estava o dragão. Virou lentamente a grande cabeça. Quando os olhos fendidos do animal encontraram os dela, Dany acordou, tremendo e coberta por uma fina película de suor. Nunca tivera tanto medo… (A Guerra dos Tronos, Daenerys, p.77).

Este padrão de sonhos sobrenaturais de natureza profética, explica porque os Targaryen são essencialmente, tão ligados à profecias, ao ponto de levá-las extremamente a sério.

No entanto, desde a morte do último dragão, ocorrida durante o reinado de Aegon III, os Targaryen se lançaram numa verdadeira corrida para trazer os dragões de volta. Levando para Westeros, feiticeiros, umbromantes, piromantes e alquimistas dos diferentes cantos do mundo.

Sem sucesso, os dragões ficaram desaparecidos por mais de 100 anos e neste meio tempo, muitos Targaryen morreram de forma trágica enquanto tentavam trazê-los de volta, pois eram atormentados pelos sonhos de dragão e porquê acreditavam que um dia eles retornariam… e certamente conheciam a profecia do Príncipe que foi prometido.

    • Aerion Targaryen, um dos irmãos de meistre Aemon, bebeu fogo vivo pois acreditava que se transformaria em um dragão;
    • Aerys II acreditava que sobreviveria ao fogo vivo sob Porto Real e se transformaria se incendiasse a cidade, segundo Jaime.
  • Aegon V, causou a grande tragédia de Solarestival ao tentar chocar os ovos de dragão pois segundo dizem, acreditava que com eles poderia implementar mudanças no reino que beneficiasse as classes populares sem precisar enfrentar os obstaculos colocados pela nobreza westerosi. Ele tentou chocar os ovos no dia em que Rhaegal nasceu.

Ao final de sua vida, provavelmente devido aos sonhos de dragão, Aegon V ficou obcecado em trazer os dragões de volta. Aproveitando para comemorar o nascimento de seu bisneto que estava bem próximo, ele decidiu reunir praticamente toda a linhagem principal da família Targaryen em Solarestival, e contratou feiticeiros vindo de Asshai para tentar chocar os ovos de dragão que ele tinha e os que estava em Pedra do Dragão. Solarestival há muito era uma importante mansão frequentemente usada pela Casa Targaryen e ficava localizada nas terras da tempestade.

Ninguém sabe exatamente como, mas as chamas saíram completamente de controle e mataram praticamente quase toda a linhagem principal da família, inclusive o rei e o Senhor Comandante da Guarda Real; Duncan, o Alto (os protagonistas da série de contos, O Cavaleiro dos Sete Reinos).

Apesar da tragédia, é dito na história que Solarestival era o local favorito de Rhaegar. Um lugar para aonde ele se refugiava munido apenas de sua harpa. Voltaremos a falar sobre isso com mais calma nos próximos ensaios.

B) – Aegon, o Improvável

Aegon V, também conhecido como Egg, ficou conhecido na história como Aegon, o Improvável. Isso porque ele estava extremamente longe da linha de sucessão do trono, sendo o quarto filho de um quarto filho. Porém, após uma série de tragédias dentro da linhagem principal, ele ascendeu ao Trono de Ferro em 233 d.c.

Como sempre esteve longe da linha de sucessão, Egg desfrutou de uma vida no mínimo interessante. Com apenas 10 anos, ele tornou-se escudeiro de Sor Duncan, o Alto; e com ele viajou por toda Westeros e além, vivendo uma série de aventuras. Evidentemente que tomando cuidado para que sua verdadeira identidade principesca não fosse descoberta.

Assim, Egg entrou em contato direto com o drama vivido pelos camponeses do continente e quando tornou-se rei, tentou estabelecer uma série de medidas que beneficiasse as camadas mais baixas da população westerosi.

Suas políticas criaram uma série de tensão com a nobreza, o que ele tentou compensar através de politicas de casamentos. O que não deu muito certo, pois com exceção de Rhaelle e Daeron, todos os seus filhos fizeram como ele e se casaram por amor.

Por ter estado tão longe da linha de sucessão, foi permitido a Egg casar-se com Bertha Blackwood, também conhecida como Bertha Negra devido os seus longos cabelos escuros. Os Blackwood são uma casa relativamente pequena para compor a linha dinástica principal, porém o casamento de Egg e Bertha não levantou resistência devido a distancia entre ele e o Trono de Ferro no momento da união.

O filho mais velho do casal, Ducan, renunciou o seu direito de sucessão para casar-se com Jeny de Pedravelha, quando ele a conheceu nas terras fluviais e ela chegou a corte acompanhada de uma misteriosa anã, que Jeny dizia ser uma filha da floresta.

Com a renúncia de Duncan, Jaehaerys herdou o Trono de Ferro, mas antes disso casou-se escondido com sua irmã, Shaera, e ambos consumaram o casamento antes que Aegon pudesse fazer algo a respeito da união dos dois. Rhaelle casou-se com Osmund Baratheon, porém, por hora, quero chamar atenção para o papel de Jaehaerys no destino de Rhaegar.

Jaehaerys teve dois filhos com sua irmã, Aerys e Rhaella Targaryen, e depois de ouvir da anã que Jeny levou para corte, que o Príncipe Prometido nasceria de sua linhagem, casou seus dois filhos contra a vontade de ambos. Jaehaerys é um claro exemplo do quão os Targaryen são ligados à profecias e o quanto eles acreditavam na profecia do Príncipe que foi Prometido e muito provavelmente, no retorno dos dragões.

Jaehaerys casou seus dois únicos filhos, muito provavelmente para não correr o risco de ter a profecia se cumprindo fora da linhagem principal. Dessa união infeliz e exatamente no dia da tragédia de Solarestival, Rhaegar veio ao mundo entre sal (das lágrimas) e fumaça (do incêndio), alimentando a crença de meistre Aemon de que ele era o Príncipe  Prometido.

Tragédia de Solarestival
Fonte: aminoapps.com

Esse fato moldou toda a vida de Rhaegar. Como ele gostava mais de livros do que espadas, é provável que tenha entrado em contato com antigas anotações sobre profecias e dragões dos reis Targaryen, inclusive de Aegon V, seu bisavô. Sem contar a influência de meistre Aemon e o modo como a tragédia de Solarestival exerceu impacto sobre sua personalidade e o modo como ele viveu.

– Quando criança, o Príncipe de Pedra do Dragão era extraordinariamente dado á leitura. Começou a ler tão cedo que os homens diziam que a Rainha Rhaella devia ter engolido alguns livros e uma vela enquanto ele estava em seu ventre. Rhaegar não tinha nenhum interesse pelas brincadeiras das outras crianças. Os meistres ficavam assombrados com sua inteligência, mas os cavaleiros do pai trocavam gracejos amargos sobre Baelor, o Abençoado, ter renascido. Até que um dia o Príncipe Rhaegar encontrou algo em seus pergaminhos que o mudou. Ninguém sabe o que pode ter sido, só se sabe que o garoto apareceu no pátio uma manhã, no momento em que os cavaleiros vestiam as armaduras. Foi direto a Sor Willem Darry, o mestre de armas, e disse: “Vou precisar de espada e armadura. Parece que tenho que ser um guerreiro.” (A Tormenta de Espadas, Daenerys, p. 89)

Por mais de 15 anos, Rhaegar foi o último de sua linhagem pois conforme explicitado No Mundo de Gelo e Fogo, até o nascimento de Viserys em 276 d.c, Rhaella sofrera uma série de abortos e deu a luz a filhos natimortos ou que morriam tempos depois.

Sem ter uma irmã para se casar conforme o desejo de seu pai cada vez mais doente mentalmente, Rhaegar casou-se com Elia Martell e quando concebeu seu segundo filho com ela, Aegon, passou acreditar que  a criança era o Príncipe Prometido.

– Ele partilhou minha crença quando era mais novo, mas mais tarde persuadiu-se de que seria o filho a cumprir a profecia, pois um cometa foi visto no céu de Porto Real na noite em que Aegon foi concebido, e Rhaegar tinha certeza de que a estrela sangrando era um cometa. (O Festim dos Corvos, Samwell, p. 447, negritos meus).

C – O dragão tem três cabeças

Aqui podemos falar da enigmática frase “O dragão tem três cabeças”, ouvida por Dany na Casa dos Imortais, num dos poucos vislumbres de Rhaegar durante toda a história.

– Aegon –  ele disse para a mulher que amamentava um recém nascido numa grande cama de madeira – Que nome seria melhor para um rei?

-Fará uma canção para ele?- a mulher perguntou.

-Ele já tem uma canção. É o príncipe que foi prometido, e é a sua canção de gelo e fogo – ergueu o olhar quando disse aquilo, e seus olhos encontraram os de Dany, e pareceu que a via ali em pé através da porta. – Terá de haver mais um –  ele disse, embora Dany não soubesse dizer se estava falando para ela ou para a mulher na cama. – O dragão tem três cabeças… (Daenerys, A Fúria dos Reis; pág 452)

Falada aparentemente após o nascimento de Aegon em Pedra do Dragão , essa frase cria um verdadeiro reboliço nos fóruns, pois sugere que Rhaegar acreditava que deveria ter três filhos, uma vez que o símbolo da Casa Targaryen é um dragão de três cabeças representando Aegon, o Conquistador, e suas duas irmãs/esposas, Visenya e Rhaenys.

Rhaenys era o nome da primeira filha de Rhaegar com Elia e Aegon, o nome de seu segundo filho, e aparentemente, o filho que ele acreditava ser a cabeça principal. Aqui, fica subentendido pela narrativa que o dragão de três cabeças e o Príncipe Prometido seriam a mesma entidade, então o príncipe nascendo da linhagem Targaryen, ele seria três pessoas, logo: seus filhos.

Porém, um pouco depois após o difícil  parto de Aegon em Pedra do Dragão, Rhaegar foi informado que Elia não mais poderia gerar filhos, pois isso poderia significar a sua vida. Dias depois, que não sabemos exatamente quantos, Rhaegar desapareceu com Lyanna Stark nas terras fluviais,caso esta cronologia esteja correta.

Aqui percebemos que sobreposto a uma percepção de Rhaegar “estuprador” ou de um “Rhaegar apaixonado”, existe um terceiro motivo, uma terceira camada: a de um Rhaegar que existiu para cumprir o seu destino. Que existiu para cumprir profecia do Príncipe que foi Prometido.

Então vamos voltar mais uma vez a profecia do Príncipe que foi prometido.

Quando a estrela vermelha sangra e as trevas reúnem forças, Azor Ahai renascerá por entre fumaça e sal, para acordar dragões da pedra.  (A Tormenta de Espadas, Davos, cap. 25)

E a essa fala de Sor Barristan à Daenerys:

– Capaz. Isso acima de tudo. Determinado, circunspecto, cumpridor, obstinado. (Daenerys; A Tormenta de Espadas)

Capaz, determinado, cumpridor, circunspecto e obstinado, qualidades ou defeitos de um homem que com certeza seria capaz de qualquer coisa para atingir seus objetivos, mesmo que isso significasse manchar a sua honra, condenar sua casa e violentar uma garota inocente ou mesmo fazê-la amá-lo, para conseguir sua terceira cabeça do dragão.

Quando você junta todas as pistas sobre Rhaegar, é a essa conclusão que se chega. Com consentimento ou sem consentimento, a profecia do Príncipe Prometido movera Rhaegar.  A terceira cabeça do dragão movera Rhaegar. A Canção de Gelo e fogo movera Rhaegar. Ele precisava de Lyanna, ele precisava ter Jon, ele precisava ter sua canção de gelo e fogo.

Bom, aqui as coisas ficam estranhas. Aqui acho que estamos cometendo algum tipo de engano talvez. Primeiro, não existe informações suficientes sobre as motivações de Rhaegar, somente fragmentos que chegam para nós em forma de quebra cabeça. Existem três histórias possíveis e talvez a resposta seja uma amalgama delas ou mesmo nenhuma das três. Se a conclusão fosse simples assim, não haveria tanto mistério e tanto cuidado do autor em segurar a verdadeira história de Rhaegar e Lyanna por cinco livros, mesmo ele sendo o principal motivo para o segredo da maternidade de Jon.

Se sabemos pouco sobre Rhaegar, sabemos menos ainda sobre Lyanna e Elia. Enquanto Elia é tachada como fracassada por não ter agradado seu príncipe dragão e permitido a ele fazer o que fez por ter sido uma esposa fraca e doente, Lyanna é simplesmente reduzida ao “gelo” da relação que gerou Jon Snow.

Na segunda parte, pretendo me debruçar um pouco mais sobre Lyanna e Elia, e sugerir uma terceira via sobre o papel de Lyanna na vida de Rhaegar.

CONCLUSÃO

Nesta primeira parte tentei explorar as duas percepções conhecidas sobre Rhaegar na história, trazendo uma terceira camada, pouco conhecida pelos personagens em geral do enredo, que liga Rhaegar a profecia do Príncipe que foi Prometido, o mesmo Azor Ahai de Melissandre.

Tentei demonstrar que a aparente “obsessão” de Rhaegar pelas profecias, era na verdade uma características dos Targaryen que uma vez salvos por profecias ao deixarem a Antiga Valíria antes da Perdição, são estritamente ligadas a elas, a ponto de um rei casar seus únicos dois filhos ao ouvir de uma anã “desconhecida” que o Príncipe Prometido nasceria de sua linhagem. Desta forma, mas do que um simples obcecado, Rhaegar foi moldado pelo próprio meio cultural que ele se desenvolveu. Como Targaryen, ele  supostamente acreditava  nas profecias e na magia e por anos ele carregou sozinho o peso de ser o último de uma linhagem quase a beira da extinção.

Tão pouco não seria estranho se descobrirmos que ele era atormentado pelos mesmo sonhos de dragão que perturbavam Daenerys, meistre Aemon e seus irmãos. Rhaegar ficou conhecido na história dos Sete Reinos como o último dragão. Talvez incutido nisto tenha algo mais poderoso do que o fato dele ter sido por um longo tempo o último de sua linhagem. Para além de uma tristeza que marcou o momento de seu nascimento em Solarestival, os sonhos poderiam ser um dos motivos para sua aparente melancolia. Ou algo a mais, que falaremos mais adiante.

Dado ao compromisso dos Targaryen com a profecia e a crença no retorno dos dragões que provocou uma série de tragédias, tentei expor que apesar de honrado, Rhaegar era também obstinado o suficiente para conseguir o que queria, custe o que custasse.


Mione Le Fay é carioca, formada em Jornalismo. Escritora, professora de informática, apresentadora e produtora de eventos. Apaixonada por livros e fotografias, encontra nesses nessas duas artes uma forma de mostrar tudo o que existe em seu mundo.

4 Responses

  1. Ahhhhh, continue essa série sobre o Rhaegar e a Lyanna por favor. Primeira vez que encontro um texto tão bem escrito sobre os dois. Parabéns pelo blog e pela análise excelente!

  2. Só gostaria de comentar que esse post foi excelente. Espero que continue! Meu personagem favorito é Rhaegar Targaryen.

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